Pesquisa aponta que o percentual dos que disseram ter entrado no crime com até 12 anos de idade passou de 6,5%, no levantamento realizado de 2004 a 2006, para 13%, em 2017
Percentual dos que entraram no crime com até 12 anos passou de 6,5% (em 2004 a 2006) para 13% (em 2017) - Maíra Coelho / Agência O Dia Rio - Uma pesquisa realizada pela ONG Observatório de Favelas, com sede na Maré, mostrou mudanças no perfil do jovem que atua no tráfico do Rio. Em uma década, a entrada no crime passou a ser mais precoce.
O percentual dos que disseram ter entrado no crime com até 12 anos de idade passou de 6,5%, no levantamento realizado de 2004 a 2006, para 13%, em 2017.
A pesquisa também mostrou dados sobre a religiosidade
dos 'trabalhadores' do comércio de drogas. Desde o último estudo da ONG,
o percentual dos entrevistados declarados evangélicos saltou de 17%
para 31,1%, no ano passado.
Já a fatia dos que dizem ser católicos caiu
de 39,1% para 11,1%.
A pesquisa da organização ouviu 261 jovens e
adolescentes, sendo 150 ativos no varejo de drogas do Rio e 111
adolescentes detidos no Departamento Geral de Ações Socioeducativas
(Degase). A maior parte dos ouvidos (62,8%) tinha entre 16 e 24 anos e
se identificava como preta e parda (72%).
As mães foram majoritariamente
citadas como responsáveis pela criação dos entrevistados (50,2%), e 62%
disseram que a motivação para a entrada no crime foi o auxílio à
família.
Além dos envolvidos no tráfico, três policiais
militares e sete especialistas em saúde responderam a dois questionários
específicos para cada grupo, respectivamente.
A intenção da inclusão
desses profissionais na pesquisa é traçar "uma análise qualitativa sobre
o quadro de Segurança Pública e política de combate às drogas, com
enfoque na área da saúde", afirma a diretora do Observatório de Favelas,
Raquel Willadino.
Segundo a responsável pela instituição, o objetivo
geral da pesquisa consiste em atualizar os dois últimos estudos feitos
sobre a temática, o primeiro em 2001 e o segundo entre 2004 e 2006, e
contribuir para "romper com os estigmas que estão vinculados aos jovens
envolvidos com o tráfico de drogas", explica Willadino.
"O que a gente pretende é oferecer subsídios para a
construção de políticas e ações públicas que visem a superação da lógica
da guerra às drogas, a fim de garantir o direito à Segurança Pública",
conclui Willadino.
Instituições de ensino mais atrativas x convite ao tráfico
Ao cruzar os dados da pesquisa, as instituições de
ensino passam a ser avaliadas como ponto-chave da transferência ou não
desses jovens para os pontos de venda de drogas nas favelas do Rio de
Janeiro.
Segundo o estudo, 78% dos entrevistados, entre ativos no varejo
e detidos no Degase, abandonaram a escola entre o 5º e o 7º ano do
ensino fundamental, ou seja, na faixa etária de 13 a 15 anos de idade.
Segundo Willadino, isso "aponta para a necessidade de
aplicar estratégias de prevenção no que tange a melhoria das
instituições de ensino". Uma vez que, nesse contexto, a escola deve
assumir a posição de rival do tráfico no conflito de interesses inerente
a mente de um jovem morador de favela.
Associação do ingresso ao tráfico com a falta de oportunidade de emprego questionada
A tese de que a oferta perene de funcionários do
tráfico está ligada à baixa oportunidade de emprego é refutada pelo
seguinte índice: 66% dos entrevistados tiveram experiências de trabalho.
"Esse dado revela que não se trata apenas de ter ou não
uma oportunidade de trabalho, mas qual a oportunidade que esse jovem
tem. Normalmente são opções defasadas, precárias, que não dão a mesma
expectativa de crescimento a curto prazo que o tráfico oferece", afirma
Willadino.
Após o auxílio à família, em primeiro lugar com 62,1%, a
intenção de "ganhar muito dinheiro" vem logo em seguida, com 47,5% das
respostas, o que caracteriza a demanda pela aquisição de bens de
consumo, de acordo com a diretora da ONG.
Saída voluntária do tráfico se manteve após mais de uma década
O percentual dos jovens que, em algum momento, deixaram
o tráfico voluntariamente permaneceu o mesmo entre 2006 e 2017. Ambas
pesquisas contabilizaram 40% dos entrevistados nesse quesito.
Para Willadino, esse índice merece muita atenção, pois
representa a manutenção da intenção de saída do modus operandi do crime
organizado baseado no livre arbítrio. No entanto, na maioria das vezes,
esse grupo não é assistido da melhor forma pelas instituições públicas.
A diretora destaca que se houvesse um plano de
políticas públicas que acolhesse esse nicho, a força do tráfico de
drogas perderia cada vez mais força, à medida que as gerações se
renovassem. "É preciso existir estratégias de prevenção ao ingresso (ao
tráfico), mas também construção de novas trajetórias, alternativas para
geração de trabalho e renda para os que querem sair desse meio", explica
Willadino.
Outros índices relevantes da pesquisa:
- 68,8% têm de 16 a 24 anos
- 72% são negros ou pardos
- 50,2% citam as mães como responsável pela criação
- 70,2% assumem relacionamentos estáveis (37% casamento/33% namoro)
- 21,1% têm irmãos envolvidos no tráfico (11,7% em 2006)
- 40% acreditam em Deus mas não tem religião
Fonte O Dia
Por
*Felipe Rebouças
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