© Fornecido por eCycle
Udu-de-coroa-azul (Momutus momota
Imagem: Léo Ramos Chaves/Revista Pesquisa Fapesp
Sequenciar o DNA de todas as espécies conhecidas
no planeta Terra em um período de dez anos desde microrganismos
invisíveis a olho nu até os mais complexos vertebrados e plantas.
Esta é
a ambiciosa meta do Earth Biogenome Project (EBP), iniciativa internacional prevista para ser lançada oficialmente em 2018.
Com
o objetivo de envolver a comunidade científica brasileira no projeto, a
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (apesp e a
Academia Brasileira de Ciências (ABC) organizaram em agosto o Workshop Biodiversity and Biobank, que contou com a presença de um dos idealizadores do EBP, o estadunidense Harris Lewin.
"Há
1,5 milhão de espécies já identificadas e caracterizadas. Mas isso
representa apenas 10% da biodiversidade terrestre. Cerca de 90% ainda
está para ser descoberta", disse Lewin, que é professor de Evolução e
Ecologia na Universidade da Califórnia, Davis, nos Estados Unidos.
Na avaliação do cientista, o Brasil tem a oportunidade de contribuir fortemente para a empreitada, pois abriga cerca de 10% da biodiversidade do planeta.
Além disso, o país conta com boa infraestrutura científica, uma rede
global de colaboração e coleções biológicas com boa curadoria.
"Trata-se
de um esforço crucial, pois muitas espécies estão desaparecendo a uma
taxa acelerada. Nos últimos 40 anos, 42% dos vertebrados tiveram suas
populações reduzidas.
Vinte mil espécies estão ameaçadas de extinção em
decorrência das atividades humanas, da destruição de habitats e dos efeitos das mudanças climáticas.
A taxa de extinção de espécies é cerca de mil vezes maior do que era há uma década", ressaltou.
Segundo Lewin, o crescimento da população humana -- que deve chegar a 9 bilhões de indivíduos em 2050 --e a rápida mudança no clima terrestre colocam o planeta em uma situação "perigosa e desafortunada".
"Alguns
já consideram tratar-se da sexta extinção em massa. Isso é uma ameaça
não apenas para essas espécies, mas para nossa própria sobrevivência no
planeta", avaliou.
Ao acessar o código genético de todas as
espécies, antes que desapareçam, os membros do Earth Biogenome Project
pretendem criar um repositório digital da vida. Tal conquista, na
avaliação de Lewin, vai revolucionar a biologia.
"Essas informações vão melhorar radicalmente os esforços de conservação de espécies e de restauração de habitats degradados", argumentou.
Até
o momento, cerca de meia dúzia de países já aderiram ao empreendimento,
entre eles Estados Unidos, França, Inglaterra, Alemanha e China. Outras
dezenas já assinaram cartas de intenção.
"A participação é
voluntária e o papel do EBP é estabelecer padrões para a coleta de
amostras, o sequenciamento do DNA, o tipo de informação que deverá
acompanhar as amostras e o armazenamento dos dados.
Também buscaremos a
melhor forma de comunicar essas ações ao público em geral para que todos
possam entender sua importância e colaborar. Há 1,5 milhão de espécies
no planeta, mas não há 1,5 milhão de cientistas. Então a sociedade
também precisa se engajar", disse Lewin.
Comunidade internacional de biobancos
O
pesquisador Jonathan Coddington, do Smithsonian Institution
instituição estadunidense que também contribuiu com a organização do
workshop , esteve presente representando outra ambiciosa iniciativa
internacional que almeja a participação de brasileiros: a Global Genome Biodiversity Network (GGBN).
Trata-se
de uma rede mundial de biorrepositórios e biobancos dedicada a abrigar
coleções de tecidos congelados ou de material genético (DNA e RNA) de
qualquer espécie terrestre com exceção da humana. A iniciativa começou
em 2011 e, atualmente, conta com 66 instituições participantes de 22
países.
"O objetivo de criar essa comunidade é poder raciocinar
globalmente e estabelecer prioridades para o sequenciamento genômico, a
conservação de espécies, o monitoramento ambiental e os estudos
evolutivos que têm base na taxonomia.
Por exemplo, dos 11 mil gêneros
que ocorrem no Brasil, quais são aqueles sobre os quais ninguém tem
informação genética? Seremos capazes de responder perguntas como essa e
indicar quem são os especialistas", explicou Coddington à Agência
Fapesp.
Segundo o pesquisador, depois dos avanços propiciados pelo
Projeto Genoma Humano, a comunidade científica tem adotado o
sequenciamento genético para responder a todo tipo de pergunta relevante
para o bem-estar humano, como garantir a segurança alimentar, produzir
energia ou encontrar a cura de doenças.
"Para isso, precisamos ter
coleções de tecido e de DNA bem preservadas, padronizadas e que sejam
representativas da biodiversidade global. Os seres vivos estão divididos
em cerca de dez mil famílias e 40% delas ocorrem no Brasil.
O país,
portanto, tem recursos únicos para contribuir para esta iniciativa e
viemos aqui para discutir como organizar essas coleções para que possam
participar", afirmou Coddington.
O pesquisador ressalta que a proposta não é exportar os recursos genéticos brasileiros e sim criar centros de sequenciamento e biorrepositórios
no país.
A ideia é produzir dados brasileiros. Somente as informações
das sequências digitalizadas seriam compartilhadas internacionalmente.
"Earth Biogenome Project e Global Genome Biodiversity Network
são iniciativas complementares.
A primeira é formada por experts em
sequenciamento genético, mas não conta com pessoas acostumadas a coletar
organismos em florestas ou oceanos.
A GGBN promove a organização dessas
amostras, estabelece boas práticas, acesso e compartilhamento de dados e
de benefícios", argumentou Coddington.
Zoológico congelado
As
condições estabelecidas pela legislação brasileira para o
compartilhamento de dados da biodiversidade foram abordadas por Manuela
da Silva, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro.
Segundo ela, um dos problemas é a exigência de que os dados depositados em bancos internacionais sejam rastreáveis algo difícil de implementar, segundo especialistas.
O
estadunidense Oliver Ryder apresentou o projeto de zoológico congelado
criado em San Diego, nos Estados Unidos.
O biorrepositório armazena
amostras de células de todos os animais abrigados na instituição.
Segundo
ele, a criopreservação de células permite, quando necessário, expandir o
material genético em culturas, oferecendo recursos para sequenciamento
em diferentes plataformas, estudos funcionais (sinalização celular,
mecanismos de doenças), produção de células-tronco pluripotentes
induzidas e, eventualmente, resgate de espécies em extinção.
"Esta
é uma oportunidade, neste momento difícil que vivemos, de mostrar que a
ciência é realmente importante para tornar o Brasil um país
sustentável", avaliou Marie-Anne Van Sluys, membro da Coordenação
Adjunta - Ciências da Vida da Fapesp e organizadora do workshop.
Fonte: Karina Toledo, da Agência Fapesp
Nenhum comentário:
Postar um comentário