© Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr
Eduardo morreu no dia 13 de agosto quando o avião em que estava caiu em Santos, litoral paulista
Três anos após a morte de Eduardo Campos, a família do ex-governador
de Pernambuco está rachada. Hoje, ela se divide em três correntes
políticas: uma do irmão, Antônio; outra do filho e da mulher, João e
Renata; e uma terceira via, com a prima Marília.
Eduardo morreu no
dia 13 de agosto, quando o avião em que fazia campanha para presidente
da República caiu em Santos, no litoral paulista; outras seis pessoas
morreram.
O pernambucano, então com 49 anos, ocupava a terceira posição
nas pesquisas com 9% das intenções de voto.
Na família, o cenário
atual é de troca de críticas e de disputa por um poder que surgiu há
décadas: a "dinastia" começou com o avô, Miguel Arraes (1916-2005),
ex-prefeito de Recife e governador de Pernambuco por três vezes.
De
um lado está o advogado Antônio Campos, único irmão de Eduardo. Neste
ano, ele saiu do PSB - partido do clã desde 1990 e que completa 70 anos
neste mês- e se filiou ao Podemos. Nas eleições de 2018, Antônio vai
concorrer a deputado federal.
Na disputa, ele enfrentará o
próprio sobrinho, João Henrique Campos, um dos cinco filhos de Eduardo.
O
jovem é visto como o sucessor político de Eduardo Campos. Recém-formado
em engenharia civil pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), ele
tem 23 anos e assumiu, em fevereiro, o cargo de chefe de gabinete do
atual governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB).
Nesse
aspecto, o jovem repetiu a história do pai, que, também aos 22 anos,
virou chefe de gabinete do então governador Miguel Arraes, em 1987.
No
dia de sua posse no governo, João afirmou que "ninguém deve ser
pré-julgado por ser filho de A ou de B, deve ser julgado pelo serviço
prestado."
A terceira corrente é encabeçada por Marília Arraes,
prima do ex-governador e, como ele, neta de Miguel Arraes. Vereadora do
Recife, ela rompeu politicamente com a família ainda quando Eduardo
concorria à Presidência, em 2014.
Deixou o PSB, filiou-se ao PT, e deve
ser a candidata do partido de Lula ao governo de Pernambuco.
Ana
Arraes, mãe de Eduardo, também tem sido cortejada como parceira de chapa
de pelo menos dois presidenciáveis.
A BBC Brasil apurou que, dentro do
PSB, o nome da matriarca é cogitado para dividir uma possível chapa com
Geraldo Alckmin (PSDB), governador de São Paulo e pré-candidato à
Presidência.
Para isso, no entanto, ela teria de deixar o cargo
de ministra do Tribunal de Contas da União (TCU), cadeira que assumiu
durante o governo de Dilma Rousseff.
Briga em família
Uma briga ocorrida no fim do ano passado
selou de vez a divisão na família Campos/Arraes.
Nas últimas eleições
municipais, Antônio se candidatou a prefeito de Olinda, cidade vizinha à
capital, Recife.
Perdeu no segundo turno, com 43% dos votos - pouco
mais de 90 mil. Era sua primeira eleição, ainda pelo PSB.
Paulo
Câmara, sucessor de Eduardo no governo do Estado, participou apenas de
um ato de campanha de Antônio em Olinda.
Isso porque o governador não
quis jogar contra os candidatos concorrentes, que eram de partidos de
sua base.
Renata Campos e seu filho João também não subiram no
palanque de Antônio.
Ao final da eleição, ele fez reclamações públicas
contra a cunhada, pois se sentiu "traído" pela falta de apoio no próprio
partido e na família.
Antônio acusou Renata de temer que ele, como um
candidato da família Campos, fizesse "sombra" para seu filho João
Henrique.
"Renata não foi grata comigo. Eduardo teve minha
solidariedade em vários momentos da vida dele", disse Antônio, em
entrevista coletiva logo após a derrota em Olinda.
"Ela acha que
qualquer candidatura, mesmo que não seja antagônica, pode fazer sombra a
João. Renata finge não mandar (no PSB), numa pretensa imagem de frágil,
enquanto manda nos bastidores o tempo todo."
A reportagem contatou Renata, João e Antônio Campos, mas eles não quiseram dar entrevistas.
Depois
da briga, o advogado deixou o PSB e entrou no Podemos, partido mais à
direita do espectro político, pelo qual deve se candidatar a deputado
federal.
Para Carlos Siqueira, presidente nacional do PSB, a
saída de Antonio não aponta divergências na família.
"Lamentamos a
decisão dele, que estava há muito tempo no partido. Quem disse que
necessariamente todos da família devem estar no mesmo partido? Cada um
toma seu rumo", diz.
Alckmin na jogada
A mudança de Antônio para o Podemos criou a
expectativa de que sua mãe, Ana Arraes, também pudesse deixar a legenda
liderada por anos por Miguel e Eduardo.
No mês passado, o senador
Álvaro Dias, que deve ser candidato à presidência pelo Podemos,
encontrou-se com a ministra do TCU em Pernambuco.
Depois da reunião,
circulou entre os pessebistas a possibilidade de Ana ser candidata em
uma chapa com o parlamentar.
O senador confirmou o encontro, mas
disse que eleições não foram o assunto.
"Nós conversamos sobre a
filiação de Antônio. Até pelo cargo que ela ocupa no TCU, não poderíamos
tratar de candidatura", afirmou Dias, em entrevista à BBC Brasil.
O
nome da matriarca é cotado ainda como vice de Alckmin em uma eventual
candidatura do tucano à Presidência. Quem articula essa aliança é o
vice-governador de São Paulo, Marcio França (PSB), aliado de Alckmin e
próximo à família Arraes.
Em 2018, França vai assumir o governo
depois que Alckmin deixar o cargo de governador para concorrer à
Presidência. Com Ana Arraes na chapa, o tucano teria um nome forte no
Nordeste, região que historicamente dá vitórias ao PT.
Já França, caso
consiga conjurar a manobra, ganharia força para um eventual apoio do
PSDB a sua candidatura ao governo de São Paulo, segundo a BBC Brasil
apurou.
O problema é que Ana, que tem 70 anos, não estaria
disposta a deixar seu cargo no TCU. E, em dois anos, ela deve virar
presidente do tribunal.
Um deputado ligado à família, que
preferiu não se identificar, resumiu a situação: "Acho muito difícil
dona Ana se candidatar a algum cargo. Se for pelo PSB, ela estaria numa
corrente contrária a de seu único filho vivo, Antônio.
Se for pelo
Podemos, estaria contra a história de seu outro filho, Eduardo."
À esquerda
Outra dissidente da família Campos é Marília
Arraes (PT), de 33 anos, vereadora do Recife eleita com 11.800 votos.
Prima de Eduardo, ela deixou o PSB por divergências com o partido.
Em
entrevista à BBC Brasil, disse que a sigla não é mais a mesma da época
em que era comandada por seu avô Miguel.
"Ideologicamente o
partido estava em outro campo, o da esquerda. Hoje, é um serviçal do
PSDB ", afirma. No segundo turno das eleições de 2014, o PSB apoiou o
tucano Aécio Neves - historicamente, a legenda apoiava candidatos
petistas.
O próprio Eduardo foi ministro de Lula.
Por outro lado,
pessoas próximas à família disseram à reportagem que, em 2014, Marília
quis se candidatar a deputada federal, mas teve a legenda negada pelo
primo, então presidente do PSB.
No próximo ano, Marília deve ser a
candidata do PT ao governo de Pernambuco. Nas redes sociais, ela
aparece em fotos ao lado do ex-presidente Lula, também pernambucano e
considerado um bom cabo eleitoral no Estado.
Hoje, Marília é
oposição a Geraldo Júlio (PSB), prefeito do Recife, e a Paulo Câmara -
os dois foram indicados por Eduardo.
Um ano antes da eleição, Câmara
enfrenta dificuldades: o Estado vive uma escalada da violência e ele é
rejeitado por 74% dos eleitores, segundo uma pesquisa de abril.
Câmara
e Geraldo Júlio são investigados por suspeita de participação no
superfaturamento da Arena Pernambuco, construída pela Odebrecht. Eduardo
também foi citado na Operação Lava Jato por irregularidades.
Para
parlamentares ouvidos pela reportagem, Marília é a que mais se aproxima
ideologicamente do avô Miguel Arraes, um político de esquerda com forte
atuação na área social.
"Não tenho pretensão de dizer em qual lado
Miguel Arraes estaria, mas posso dizer em qual ele não estaria, que é
esse projeto liberal e entreguista do PSB hoje", afirma ela.
No
entanto, a vereadora não deve ter apoio de toda a família nas eleições,
pois a tendência é de que Renata e João permaneçam ao lado de Paulo
Câmara.
Partido
A crítica de Marília sobre as condições ideológicas
do partido é repetida por filiados mais antigos do PSB.
A sigla está
dividida entre redirecionar sua trajetória mais à esquerda ou se
projetar à centro-direita de vez.
Na votação da Câmara que
rejeitou a denúncia de corrupção passiva contra o presidente Michel
Temer (PMDB), essa divisão ficou latente: 22 deputados votaram pelo
prosseguimento das investigações e 11 votaram pelo arquivamento.
A
executiva da legenda havia decidido ficar contra Temer, mas a líder da
agremiação, Tereza Cristina, votou a favor do presidente.
Na
votação da reforma trabalhista, em abril, 14 parlamentares votaram favor
da medida e 16, contra.
Eduardo Campos afirmou em 2014 que era contra
mudanças na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).
Para Carlos
Siqueira, a "divisão do partido" ocorre apenas na bancada da Câmara.
"A
bancada é uma instância do partido, não ele inteiro. Pessoas que
divergem devem arrumar seu rumo, ou se adaptar às posições históricas do
partido. Mas a decisão de entrar ou ficar é pessoal", disse.
'Eduardismo'
Segundo
Adriano Oliveira, cientista político e professor da UFPE, a imagem de
Eduardo Campos ainda influencia a escolha do eleitor pernambucano. Por
isso, a briga por seu legado.
O pesquisador explica o
"eduardismo", conceito que ele associa ao lulismo: "Eduardo conseguiu
ser uma quase unanimidade: tinha eleitores em todas as faixas sociais,
dos mais ricos aos mais pobres. Ele era carismático, tinha capacidade de
aglutinar pessoas de várias vertentes e passava a imagem de
trabalhador", explica ele.
"Com apoio de Lula, conseguiu alavancar
Pernambuco. Claro que, com o tempo, houve um declínio, até por causa de
sua morte. Mas seus sucessores, Câmara e Geraldo Júlio, ainda estão
aí", diz.
Próximo a Arraes e Eduardo, Carlos Siqueira conta uma
história de tom premonitório sobre o destino da família: Miguel não
queria que nenhum de seus dez filhos seguissem carreira política.
"Eu
perguntava a ele: e seu neto Eduardo? Miguel respondia: ele faz o
caminho dele, tem o jeito dele", conta o presidente do PSB. "Arraes
tinha receio de ser visto como um coronel do Nordeste, daqueles que têm a
família inteira na política."
Fonte BBC Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário